Quando a minha primeira filha nasceu, não senti o “amor incondicional” que se ouve falar, que se vê nos filmes ou que se lê nos livros.
Senti pouco, na verdade. Uma espécie de vazio de emoções. Ou se calhar senti muito e todos esses sentimentos anularam-se uns aos outros.
Estava ali um ser humano que não conhecia, um bebé como muitos outros. Penso muitas vezes nesse dia e da sensação de culpa que tive, por não corresponder às expectativas. Porque razão não chorei ou não estava a transbordar de felicidade? Será normal não sentir um grande apego?
Eu estava feliz, claro, mas não era o meu principal sentimento. Também não estava preocupado. Diria que estava neutralmente apreensivo. Talvez… Ainda não sei e acho que não interessa.
No momento em que escrevo este texto, ela tem quase 5 anos. Já consigo perceber que uma relação pai/filha vem da afinidade, do (re)conhecimento mútuo e dos laços que se vão criando ao longo do tempo. É uma união em constante mutação que só vai melhorando e fortalecendo.
Pelo menos até agora. Pelo sim, pelo não, na adolescência escrevo outro texto.
Entretanto já fui pai pela segunda vez e a verdade é que a minha reacção no parto já foi aproximada à dos livros/filmes. Devo-o à minha primeira filha e ao que ela me ensinou.
Percebi que talvez não seja psicopata. Acabei por constatar que não há sentimentos errados (nem iguais) no nascimento dum filho. A afinidade constrói-se, como em qualquer relação com outra pessoa: com empatia, compreensão e muita aprendizagem. De ambas as partes.